terça-feira, 29 de setembro de 2009

POEMAS DE MEU AVÔ- NOVENA DO LAVRADOR


O Boi



Dando todo o seu valor

ao arado que conduz,

não vê ele o que produz,

escravo d'outro senhor.



Ouvindo a canção dolente,

entoada com carinho,

entristesse o pobrezinho,

quem o guia vae contente.



E foi a sua humildade,

sacrificou seu destino,

p'rá ingrata humanidade,



que não vê o que é divino !...

Ele de boa vontade,

Bafejou o "Deus Menino" !...


RETORTA 8-XI-1925

Leopoldo Parreira


A SENILIDADE DO BARÃO

Poema do Barão de Pindaré Jr.*


Por favor, não me venham com esse papo
furado de que idade é uma questão de espírito...

Pode ser... mas que é que eu faço
com as pelancas do braço
com as rugas
e com a flacidez das nádegas?

Recorro ao Pitanguy, escondo com camadas
de roupa ou de cosmético ou
me exibo como um maracujá de gaveta?

Ok, oitenta anos valem quatro vez mais
que vinte... Mas, aonde? No Clube da Terceira Idade?
No chá da Academia? No Instituto Histórico?

Ok, tem muito velho pra frente...
Mas, quem vem atrás? Eu, heim... ridículo!

Perfeito: tem velho jovial, avançado
na vanguarda... tem jovem antiquado.
E daí, pra que serve esse consolo?

Nem vale aquela piada: troco 80 por 4 de 20...
Que é que eu faço com elas? Rezo o terço no quarto?

Exato: existem exceções... Picasso era um tesão
em seus noventa aninhos.... Ou não... apesar do (re)nome.
Mas podes crer: o que abunda é velho
resmungão, ranzinza, rabugento. rrrrrrr.... Eu, rrrrr...rrrr...



* Barão de Pindaré Jr. é o pseudônimo de Antonio Miranda para poemetos politicamente incorretos...

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

POVO QUE CANTA NÃO PODE MORRER

MUSICA DO CAMPO

São as aves com seus trinos

que encantam a sementeira

suavisam a canseira,

com seus variados hinos.

De manhã a cotovia,

é o toque de alvorada,

a calhandra namorada

gorgeia durante o dia.

Depois à tarde, ao sol-pôr,

pintassilgo e verdelhão

entoam com mais ardor.

Argumentam com paixão !

O rouxinol com amor

faz á noite a oração.

Monte da Retorta -8-XI-1925

Leopoldo Parreira

SE FORES UM DIA A SERPA

domingo, 20 de setembro de 2009

POEMAS DE MEU AVÔ- NOVENA DO LAVRADOR


O TRIGO



Tem a pureza da Esperança

o seu verde, em pequenino

e mais tarde o seu destino,

é fiel n'essa lembrança.



Quando já louro perfeito,

logo é sacrificado.

Sendo por todos amado,

desejado o seu proveito.



Foi Deus, conhecendo o bem

que a todos êle fazia;

- dar-nos um exemplo vem -



E foi no seu grande dia !

Na ceia de Jerusalem,

fez d'êle a "Eucaristia".


Estoril - 7-XI-1925

Leopoldo Parreira

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

PAIXÃO




Sinto

Sinto
que em minhas veias arde
sangue,
chama vermelha que vai cozendo
minhas paixões no coração.

Mulheres, por favor,
derramai água:
quando tudo se queima,
só as fagulhas voam
ao vento.


Federico García Lorca, in 'Poemas Esparsos'

RETRATO DE MULHER TRISTE



Retrato de Mulher Triste

Vestiu-se para um baile que não há.
Sentou-se com suas últimas jóias.
E olha para o lado, imóvel.

Está vendo os salões que se acabaram,
embala-se em valsas que não dançou,
levemente sorri para um homem.
O homem que não existiu.

Se alguém lhe disser que sonha,
levantará com desdém o arco das sobrancelhas,
Pois jamais se viveu com tanta plenitude.

Mas para falar de sua vida
tem de abaixar as quase infantis pestanas,
e esperar que se apaguem duas infinitas lágrimas.

Cecília Meireles, in 'Poemas (1942-1959)

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

POEMAS DE MEU AVÔ-NOVENA DO LAVRADOR


O ARADO I



Onde aves tiveram ninho,

sae primeiro o seu futuro,

para trabalho tão puro;

de já velho e tosco azinho.


Depois a arte transforma

e vae juntar-lhe o metal

que produz o bem ou mal

conforme é a sua norma.


Logo que á terra voltou

como quem lhe pertencia,

seu corpo todo gastou.


Enquanto ele estremecia,

o bom lavrador cantou

e para ele sorria !...




O ARADO II



Para o velho lavrador

é o seu melhor amigo

e vem já de tempo antigo

vivem em paz e labor.


O arádo pede á terra

a riqueza do celeiro;

quem o guia prazenteiro

espera o que ela encerra.


No quando chega o bem

que a ambos é devido,

não despresando ninguem!


O pobre é socorrido,

a felicidade vem,

Deus fica reconhecido !


Estoril 30-X-1925

Leopoldo Parreira

terça-feira, 8 de setembro de 2009


Um dia a maioria de nós irá se separar.

Sentiremos saudades de todas as conversas jogadas fora, das descobertas que fizemos, dos sonhos que tivemos, dos tantos risos e momentos
que partilhamos.

Saudades até dos momentos de lágrimas, da angústia, das vésperas dos finais de semana, dos finais de ano, enfim... do companheirismo vivido.

Sempre pensei que as amizades continuassem para sempre. Hoje não tenho mais tanta certeza disso.
Em breve cada um vai para seu lado, seja pelo destino ou por algum desentendimento, segue a sua vida.
Talvez continuemos a nos encontrar, quem sabe...nas cartas que trocaremos.
Podemos falar ao telefone e dizer algumas tolices...
Aí, os dias vão passar, meses...anos... até este contacto se tornar cada vez mais raro.
Vamo-nos perder no tempo....
Um dia os nossos filhos verão as nossas fotografias e perguntarão:
- "Quem são aquelas pessoas?"
Diremos...que eram nossos amigos e...... isso vai doer tanto!
"Foram meus amigos, foi com eles que vivi tantos bons anos da minha vida!"
A saudade vai apertar bem dentro do peito.
Vai dar vontade de ligar, ouvir aquelas vozes novamente......
Quando o nosso grupo estiver incompleto...reunir-nos-emos para um último adeus de um amigo.
E, entre lágrima abraçar-nos-emos.
Então faremos promessas de nos encontrar mais vezes daquele dia em diante.
Por fim, cada um vai para o seu lado para continuar a viver a sua vida, isolada do passado.
E perder-nos-emos no tempo.....
Por isso, fica aqui um pedido deste humilde amigo: não deixes que a vida passe em branco, e que pequenas adversidades sejam a causa de grandes tempestades....
Eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!


Vinicius de Moraes

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

TRADIÇÃO ORAL


CANTIGA





Quando Judas se formou,

Em palacio de grande altura,

Muita gente lá penou,

Outra foi á sepultura;

Casa cheia tem fartura,

Não sou só eu que o digo;

A gallinha corre ao trigo,

A fama é do pardal;

Não há doutores sem ter livros,

Nem altar sem castiçaes,

Não há portas sem postigos,

Nem burro sem atafaes,

Tambem lhe é dado estribos;

Nas vendas se vendem figos

P'ra contentar os rapazes;

No mar andam alcatrazes,

Também se pescam gaivotas;

Quem tem as pernas tortas

Logo lhe chamam canejo;

Curam-se as sezões com desejos

E as fr'idas com enguento,

Moem os moinhos com vento,

Quem faz a teia é a aranha;

Esta cantiga é tamanha

Não tem princípio nem fim;

Um raminho d'alecrim

É que se dá aos namorados;

As armas são p'rós soldados

E tambem p'rós caçadores;

Isto de quem tem amores

C'o pé ligeiro deve andar;

Fez-se a gaita p'ra tocar

E o pente para a cabeça;

Menina não me endoideça

Que se pode dar por feliz;

Tem um tamanho nariz

Que até lhe chega ao seio;

Já me vieram dizer

Que tem mais de palmo e meio;

Vae-te d'aqui nariz malvado

Criado tanto rigor,

Já m'o vieram gabar

P'ró quêjado d'um pastor.



in Revista Lusitana - 1888/1889

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

POEMAS DE MEU AVÔ-NOVENA DO LAVRADOR


NOVENA DO LAVRADOR-2ª



O Lavrador




Se já velho, tem meiguice

e devoção verdadeira,

vê na terra companheira,

bem diz a sua velhice.



Sendo novo tem corágem,

nunca temendo sofrer;

amar, sorrir e colher,

é essa a sua miragem.



Tendo família é feliz,

e para ele produz

tudo quanto faz e diz,



cheio de vontade e luz.

Desejando o que Deus quiz,

só o dever o seduz.!


7-XI-1922

LEOPOLDO PARREIRA

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SINES, ALENTEJO - SERPA, Portugal
“Eu não sou eu nem sou o outro, Sou qualquer coisa de intermédio: Pilar da ponte de tédio Que vai de mim para o Outro.”