domingo, 23 de janeiro de 2011


Pobres de pobres são pobrezinhos,
Almas sem lares, aves sem ninhos

Passam em bandos, em alcateias
Pelas herdades, pelas aldeias.
E em Novembro, rugem procelas...
Deus nos acuda, nos livre delas.
Vem por desertos, por estevais,
Mantas ao ombro, grandes bornais,
Como farrapos, coisas sombrias,
Trapos levados nas ventanias ...
Filhos de Cristo, filhos de Adão,
Buscam no mundo côdeas de pão!
Há os ceguinhos, em treva densa,
De olhos fechados desde nascença.
Há os fridas esburacadas,
Roxas de lírios, já gangrenadas.
Uns, de voz rouca, grandes bordões,
Quem sabe lá se serão ladrões!...
Outros humildes, riso magoado,
Lembram Jesus Cristo que ande disfarçado ...
Enjeitadinhos, rotos, sem pão,
Tremem maleitas, de olhos no chão ...
Campos e vinhas! Hortas com flores!
Ai, que ditosos os lavradores!
Olha: fumegam tectos e lares ...
Fumo tão lindo ... branco, nos ares!
Batem às portas, erguem-se as mães,
Choram meninos, ladram os cães ...
Rezam e cantam, levam a esmola,
Vinho no bucho, pão na sacola.
Fruta da horta, caldo ou toucinho.
Dão sempre os pobres a um pobrezinho.
Um, que tem chagas, velho coitado,
Quer ligaduras ou mel rosado
Outro, promessa feita a Maria,
Deitam-lhe azeite na almotolia,
Pelos alpendres, pelos currais,
Dormem deitados como animais.
Em caravanas, em alcateias,
Vão por herdades, vão por aldeias ...
Sabem cantigas, oraçõezinhas,
Contos de estrelas, reis e rainhas ...
Choram cantando, rezam penando
Ai, só a morte sabe até quando!..
Mas no outro mundo Deus lhes prepara
Leito o mais alvo, ceia a mais cara ...
Os pés doridos lhos lavarãoSantos e santas com devoção!
Para lavá-los, perfumaria
Em gomil de ouro, de ouro a bacia.
E, embalsamados, transfigurados,
Túnicas brancas, como em noivados,
Viverão sempre na eterna luz,
Pobres benditos, amem Jesus
«Guerra Junqueiro»
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SINES, ALENTEJO - SERPA, Portugal
“Eu não sou eu nem sou o outro, Sou qualquer coisa de intermédio: Pilar da ponte de tédio Que vai de mim para o Outro.”